quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Poemas premiados com Menção Honrosa no IV Concurso de Poesias Zila Mamede

Paisagem de meus olhos



O sertanejo:
duro, moreno, olhos cegos de tanta luz...
Boca moscando um quê de nadinha,
cuspindo seco.


O sertanejo:
vivente acordante.
Trabalhador de correias,
construtor de açudes
sempre secos, feito as
pontas de galhos que se quebram na vista dessa estrada...






Canção pra cabloca do meu sertão




A mulher abre a porta,
varre o quintal,
levanta poeira.
À pino está o sol,
o nordeste queima o horizonte,
“quanto vento morno!” –
lembra na rede o homem quente.
Uma sombra nos olhos
Ardem feito poeira do chão de barro.
A barriga inchada do filho descalço
Lembra: “é hora de feijão com farinha”.
“ – Quem vem pra mexer
a panela que entorna
um coração pedinte de sonhos?”






Canção pra nega velha da Fazenda


A negra velha
Ajoelha-se diante do santo.
Põe feijão, folhas de louro,
Rosas, sal grosso.

Pede bênçãos, pede liberdade,
pede vida boa pros netos.
São muitos: negros, mulatos, sararás.
Um quase branco.
“Isso dá vida à vida?”
É sangue negro, sangue grosso,
desce das costas
que a chibata abriu.

A velha negra dorme quieta
tem no colo um pobre ser
e canta firme:

“Vem, meu Deus,
alumiá meu dia,
alumiá a vida,
alumiá meus sonhos!”





Leves vestígios


O homem de chinelo
aparece no meio da estrada,
veste algodão cru,
corpo esguio,
olhar sereno.

Parece dominar a natureza.
Inclui simplicidade
no caminho,
andando, deixa marcas
atrás de si.

Solitário ente
Perdido entre árvores secas,
Trilhas poeirentas.
Por pontes passa,
carregando sua dor.

Na beira d’água
deixa outra marca.
Beijo selado na areia.

O homem de chinelo
trabalha de sol a sol,
constrói mundos,
novidades, sonhos.

Tão leves, tão frágeis.
No fim, tudo desaparece.
Fica só a marca
dos longos pés no chão de terra.




Urgência pós-moderna


Preciso de casas
pequenas
arejadas
insípidas
para sustentar
os pesos
mortos
de meu vivo coração.

Preciso de igrejas,
messiânicas
católicas,
russas e mulçumanas,
para encontrar
um Deus
aberto que abençoe
meus inúmeros
pecados
sãos.

Preciso de gente:
homens,
mulheres,
crianças.
Principalmente
homens que julguem
meus dias inglórios,
trágicos, dramáticos e nulos.

Preciso de fé,
paixão
sexo,
escuridão, mais ainda
de castiçais que se
apaguem ao
encontrar com minha alma
perdida,
amarelada,
imunda,
de solitária transgressões.