domingo, 14 de dezembro de 2014

A Frida que me causa dor

A saia longa escondia a perna torta da mulher que pintava
 a dor de si ...
Amarelo luz para o sangue da vida
Vermelho ardente para jornada dos pés que não se moviam
Azul dureza das paredes nuas que não abriam para o ar
O marrom velho da pele antiga
chega a doer no toque leve
dos dedos rígidos.
Um preto de olhos, de pelos, de cruzes
Armam os registros
Coloridos, insanos, transbordando
Humanas carícias mexicanas
Na cama ardente.
As costas nuas, coisa simples, osso apenas,
Insiste em moer por dentro,
Pelos ossos, pela emoção que se arrebenta em peitos
Vazados sem leite...
Ai, Frida! Ai, Frida, como não sair dura
De suas passagens, travessias, sonhos – ferramentas
enterradas  nos mil rostos iguais que tantos

traços misturam e congelam em molduras?

Em 15 de fevereiro de 2014....




Imagem retirada de : http://www.zupi.com.br/exposicao-de-fotografias-de-frida-kahlo-vem-ao-brasil/


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quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Sobre Pietàs desse mundo

Pietà de Giovanni Bellini (1460/4) |
 Galleria dell’Accademia, Veneza
a
Muito difícil mesmo é ver uma mãe, carregada de dor no semblante, contar (talvez pela milésima vez) sua via crucis com um filho doente. Mais difícil ainda é dizer "já sofri tanto nessa vida" diante de uma breve narrativa que mistura coragem-desânimo, fortalecimento espiritual-amargura numa trajetória que tinha tudo para ser uma feliz história de uma família unida, com filhos bem criados, formados e estabelecidos. Foi isso que ouvi em minhas andanças como gente, ao conhecer uma distinta senhora e mergulhar em seu desabafo no tempo de poucas horas de viagem.

A Pietà de Miguel Ângelo (1498) | 
Basílica de São Pedro, Roma
Não cai bem, para meu espírito de mãe, detalhar a dureza que tomou conta dos dias dessa mãe, seria extremamente de mal gosto e poder-se-ia entender que usei da dor alheia para "me inspirar". Ao contrário disso, também desabafo aqui, para dizer que não sofro nadinha, já sofri um dia, mas passou, ficou lá atrás. E isso é tudo. Mães idosas que carregam no colo filhos jovens doentes; mães que enxugam dores, suores e lágrimas de filhos desiludidos pela doença "com nome ruim", tratamento desumano em longas sessões de espera e ânsia; mães idosas a cantar, a orar, a levantar os olhos  pro céu - sem nem saber se é em súplica, em espanto ou mesmo incredulidade, tudo isso me fez lembrar de minha avó Edith, quando um dia, segurando as contas do rosário, deixava cair suas lágrimas de cor azul pelo canto dos olhos, disse baixinho: "Nenhuma mãe deveria ver um filho sofrer, quanto mais enterrá-lo. Isso é contra a ordem natural! Eu deveria ter ido primeiro". E eu sabia que ela falava de minha mãe - cuja morte prematura ela nem viu nem acompanhou. Para Deus dizia sempre: "Nem pude cuidar de seu corpo doente!".

A nobre mulher que conheci nessa viagem, disse algo que me tocou a alma, assim como as palavras de minha avó: "Nessa idade, quando tudo estava arrumado, organizado e eu tinha cumprido minha missão de mãe, vem a vida e muda tudo. Estou a cuidar de um filho homem, do mesmo jeito que um dia cuidei de um filho bebê doente!". E seus olhos bailaram no vazio da janela do carro. A imagem disse tudo, enfim.













La Pietà de Salvador Dalí (1982) | 
Teatro-Museu Dali, Figueres


domingo, 24 de agosto de 2014

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Aviso aos que adotam o Ponto Final e Pronto!

O mundo pode ser menos complicado
nada é o fim do mundo...
nada deve ser tão radical...
por isso, gosto tanto das reticências...






Imagem: Pesquisa Google..

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Serra do Araripe

O sol azul iluminou
verdemente as samambaias 
vermelhas das Serra dos Peixes

Uma mão amarela
colheu a flor branca
sem sentir o perfume
dos coqueiros alados...

As nuvens tristes choraram
No campo de milho...
Quem dirá não haver
Vento e tranças nas espigas?


In: BENEVIDES, Araceli Sobreira. O chamado ou um cântico para a liberdade. 2 ed. São Paulo: Editora Scortecci, 2008, p.91.


Vendo a imagem da Serra do Araripe num post de minha prima Fernanda Menezes, deu saudade do mês de junho no Cariri. Fui buscar no baú de meus escritos uma forma boa de matar a saudade das terras que emocionaram minha alma!

Arquivo pessoal de Fernanda  de Menezes Sobreira

quinta-feira, 27 de março de 2014

Um poema para Caio...






Poema presente na Coletânea "15 Poetas do RN" - menção honrosa no concurso Luís Carlos Guimarães/ 2014 - Fundação José Augusto/Secretaria Extraordinária de Cultura do RN.

Arte de Emanuela Medeiros



quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

POR QUE AMO LER

 
(Depoimento em forma de poema)
 
A palavra que vem do Outro...
A enorme procura.
A ânsia de viver outras vidas,
de não ser eu mesma,
mas, ao mesmo tempo,
ser, sem ser a mesma...

Palavras outras, palavras minhas,
substanciadas em conteúdos
devorados, trocados,
sonhados, re-colhidos...

Um amor despertado em
páginas-mundos agitados,
removidos,
rememorados,
transportados para outra esfera,
que me trazem para o aqui,
o agora e o porvir, também.

Enxergar melhor o que em mim é o mesmo,
o diferente, o disperso, o ausente, o silêncio.
Em lendo, emergir na voz interna que grita:
“Corre, vá, mundo afora...”
Embora esteja presa neste corpo que apenas gira a página.

Em lendo, transformar-me em tudo.
Embora os olhos se retraiam, míopes, cansados.
Outros olhos, não mais perdidos:
Só brilho, encanto, mito.

E as palavras?
Lendo-as, torno-as minhas,
Recebo-as em pensar, em colheitas fartas,
Em compartilhar.
Escrevendo-as, retiro de mim o que me doaram.
De um jeito entraram,
de outro jeito saem: fluidas, mágicas, plurais em tom, rimas, canto e coro.

Lendo-as, relendo-as,
um amor eterno, juvenil,
antes mítico, hoje meta.

Devorar o mundo das letras,
Sendo voraz nessa fome sem fim: ler, ler, ler!

Publicado inicialmente em:

http://alb.com.br/arquivo-morto/linha-mestra/revistas/revista_04/depoim_04.asp.html

Imagem: Arquivo Pessoal 

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Arisco


O cisne branco que não veio passear no meu lago naquela tarde, tirou a tarde para se esconder por entre as folhas verdes e largas dos arredores. Passei a tarde sentada, jogando pedrinhas na água escura sem saber como alcançar a glória das asas abertas, prontas para a dança ao ocaso. Os fones no ouvido me faziam um ser do tempo real, a imaginar o brilho laranja por sobre as águas do lado onde sempre me escondo. Tudo acima de mim tinha a mesma rotina: o lago, meus sonhos, o céu alaranjado de raios e sombras. Faltava apenas o farfalhar das penas brancas a brincar com o vento solto. Comigo era sempre assim: a rotina do inusitado.

        "Hoje eu quero vê-la me achar - o que tem de novo para largar o mundo, ouvindo aquela música          que não para? Já fiquei tonto demais para rodar na marola dessas águas...Quero sentir de                  perto a cara feia do caçador de verde que não atira nunca, com medo de errar!"