Nesta semana, conheci a Mulher das Plantas do Fim da Rua. Tanto como eu, a mulher dedica-se às fruteiras, às orquídeas e árvores nativas... Vinha eu caminhando e tentando manter o passo acelerado quando a vi de longe. Segurava uma dessas sacolas da moda. Havia garrafas vazias que ela ia pegando, ao se abaixar sobre os canteiros da calçada enorme. Enorme mesmo para uma cidade onde as calçadas não ultrapassam um metro e meio. Não me contive:
- Oi, sou A mulher das Plantas do Início da Rua...ali, na parte mais estreita onde havia umas dracenas.
Ela não disse nada. Olhou-me curiosa, ajeitando os óculos no nariz pontiagudo.
- Acho lindo quando passo aqui e a vejo molhando as plantas...
- Pois é, ninguém dá valor. Sou eu sozinha a lutar por elas.
- Eu também...lá no início...
Ela nem deu muita bola, não. Continuou a encher a sacola com as garrafas. Fazia um calor enorme e, como interrompera a caminhada, meu corpo suava muito, Acho que desconfiou um pouco do meu nome e das minhas ações...
- Eles arrancaram todas as plantas lá do início, não foi? Perguntou, assim, com uma cara bem alheia...sem parar de andar. Acompanhando-a, expliquei que sim, realmente eles arrancaram todas as plantas, principalmente as dracenas e as mudas de mini-ipês.
- Tinha mini-ipê ali?
- Tinha sim...
- E você deixou?
- Não tinha como.Quando passei o homem da prefeitura já tinha tirado tudo. Mas ele garantiu que iriam plantá-las em outro lugar.
- Duvido. Eles homogeneizaram a rua. Tudo igual. "Viva la difference" passou longe dessa rua. Todo mundo tem que ter uma palmeira real na calçada. E assim tudo fica bonito na cabeça do prefeito!
Não tive como discordar. Ali, na calçada, um cajueiro, um ipê, uma mangueira cresciam espaçosamente, totalmente alheios às palmeiras enfileiradas um quilômetro acima.
A mulher atravessou a rua e eu tentei cativá-la:
- A senhora gosta de roseiras? Tenho várias mudas que distri...
Nem terminei de falar. Pegou-me pela mão e foi bem direta:
- Olha aqui, minha filha, roseira dá muito trabalho, gosto de flor fácil, sem complicação. Tenho cem orquídeas. Deu um bichinho daqueles....um branquinho...botei de tudo...e nada, agora, estão ali, definhando...tsk...tsk..tsk...quando acabarem, acabaram.
- Tenho jasmim...
- Aqui não tem mais espaço, ganhei duas espécies novas. Ontem gastei 70 reais para um homem cortar os galhos secos, tirar as folhas...Sabe, minha filha, aqui não tinha um poste, quando cheguei. Agora os homens chegam, reclamam que os fios estão encostando nas árvores e eu digo para eles: "É o contrário, meu senhor, os fios chegaram depois"...eles chegam colocam aquela escada horrorosa, depenam as bichinhas, e ainda pensam que fizeram um favor. As coitadas ficam assim aleijadinhas, tortas, sem estilo nenhum e eu tenho que aceitar calada, senão, vem o velho, o pior de todos e corta tudo, arranja geral, feito o que fizeram com as suas plantas - lá no início da rua. Fico pastorando o dia todo...se não abro olho, arrancam tudo.
- É, a senhora tem razão.
Eu tinha que continuar a andar...tinha uma cardiologista no meu pé! Dei dois passos à frente, despedindo-me, mas uma força maior fez com que insistisse:
- Bonsai? A senhora tem um bonsai?
- Bonsai? Ah, tenho um, sim, mas não sei fazer, não. Só um pouquinho, aquele de fícus... você tem, é?
Vi um sorriso no rosto bronzeado da Mulher das Plantas do Fim da Rua. Também sorri, já com cara de "Ufa, até que enfim, acertei uma"!
- Pois vou trazer uma para a senhora. Um bougainvíllea...
- Um vermelho, só traga se for vermelho.
Nunca tinha feito uma caminhada tão proveitosa. Segui até o final da rua, mortinha de felicidade.
* * *
Imagem: Acervo particular da autora.